RESUMO
Apesar dos filhos receberem o seu nome pela mãe, em algum momento da
história de israel, na verdade, a sociedade era patriarcal. As mulheres eram
consideradas inferiores, mas às mães cabia a educação dos filhos. O homem
casava com diversas esposas além de Possuir concubinas. Os filhos eram considerados bênçãos. Aos pais era
confiada a tarefa de ensinar a tradição religiosa e a profissão aos filhos
homens.
Palavras-chave: Israel;
filhos; familia.
1 INTRODUÇÃO
Para
nos localizarmos corretamente no tema da família no Antigo Testamento, temos
que considerar alguns aspectos que são fundamentais nesta transposição cultural
e histórica. Uma destas “distâncias” se refere ao contexto histórico onde
Israel estava inserido. Um outro elemento é o fato de que o Antigo Testamento é
um conjunto literário escrito numa larga margem de tempo, o que determina
diferentes modos de vida familiar.
Por outro lado,
estamos tecendo algumas considerações, apenas. Não é nossa pretensão aprofundar
demais o assunto, mesmo porque dentro da linha editorial desta publicação, isto
ficaria pedante. Um outro elemento que precisa ser levado em consideração
ainda, é o limite de espaço. Para se aprofundar este tipo de tema seria
necessário construir uma dissertação bastante volumosa. Contudo, o propósito
desta publicação é provocar o leitor dentro de alguns temas e dentro deste
propósito apresentar a nossa “provocação”.
2 PATRIARCADO OU MATRIARCADO
Muitos estudos realizados sobre a vida social do
israelita primitivo, 1800-1030 a.C. dão-nos conta que há fortes indícios da
presença do matriarcado na sociedade de Israel. Se levarmos em consideração textos
como Gn 29.31-35; 30.18-21; 35.16-18a, percebemos que a tarefa de nominar os
filhos cabia à mãe.
Vejamos que a diferença entre o patriarcado e o matriarcado não se
estabelece pelo exercício do poder no seio da família, mas pelo membro do casal
por onde passava a hereditariedade. Povos primitivos contemporâneos de Israel,
que adotavam o matriarcado, consideravam “parentes” os familiares da mãe. É bem
verdade que nas sociedades primitivas, o matriarcado era uma característica de
civilizações de pequenas lavouras enquanto que o patriarcado era característico
das civilizações pastoris.
A tarefa de dar nomes aos(às) filhos(as), juntamente com outros detalhes
que não cabem aqui esmiuçar, é um indício muito forte de que em Israel
predominava o matriarcado, pelo menos nalgum período de sua história. (DE VAUX,
1964, p.49). Contudo, não podemos fechar os olhos para o conceito de bet’ab (a casa patena) nem para as imensas
listas genealógicas, cuja linha de sucessão passava pelo pai e rara-mente incluía
as mães.
3 AS FAMÍLIAS DE ISRAEL
Temos que considerar que o termo
bet’ab, do hebraico, se refere a um tipo de família que envolve muito mais
gente do que estamos [Edição original página 11/12] acostumados a pensar. Estão
incluídos nesta casa paterna, os filhos casados e suas esposas e filhos(as) bem
como outros tipos de “agregados” como forasteiros que se achegavam em busca de
proteção. Há momentos em que o Antigo Testa-mento admite que nesta bet’ab está
incluído, também, um grupo bem maior de pessoas que podemos chamar de mispahah. Em outros textos bet’ab chega a se
referir a todo Israel.
Quando Neemias
(7.4b) utiliza a expressão, “e as casas não estavam edificadas ainda” se
referindo às famílias que ainda não estavam constituídas. A família gozava de
um aporte de proteção dentro de um contexto so-cial maior, às vezes chamada de
clã (mispahah- grande família). De forma especial no período chamado de
“assentamento” na Palestina, a base social era a família, cujos la-ços
consangüíneos eram fundamen-tais e objeto do legislador no que diz respeito à
proteção.
Segundo THIEL
(1993, p.82) a “fa-mília formava um grupo solidário. Oferecia a seus membros
seguran-ça, proteção jurídica e sustento. Es-sa coesão estreita expressava-se
também em relação a terceiros: a família era responsável coletiva-mente por
erros cometidos por cada um de seus membros, especialmen-te pelo chefe da
família”.
4 O PROTETOR
A
sociedade primitiva de Israel con-tinha um elemento significativo pa-ra a
permanência do patrimônio em poder da família. Trata-se do go’el, em síntese, o
protetor. Esta função está regulamentada no capitulo 25 de Levítico e que
merece ser lido. Mais que o protetor, go’el era um resgatador de bens e pessoas
para que a pobreza não tomasse contra dos(as) filhos(as) de Israel. Ele
de-veria intervir no caso de um israeli-ta ser vendido por causa de dívidas.
Cabia-lhe o
privilegio de comprá-lo. A história de Ruth ilustra muito bem o significado da
função do go’el vis-to que além de resgatador de pro-priedade, Boáz se torna
também aquele que cumpre o preceito do levirato - dar filhos ao morto que não
deixou herdeiros. Alem de resgatador do patrimônio e propiciador de herdeiros
ao faleci-do, ao go’el também cabia o
dever da vingança no caso de derrama-mento de sangue. Esta, sem duvi-da, era a
função mais espinhosa para o go’el porque im-plicava matar quem houvesse
ma-tado o seu protegido.
DE VAUX (1994,
p.35) se refere a esta função com as seguintes pala-vras: “A obrigação mais
grave do go’el israelita era a de assumir a vingança do sangue, no qual se
descobre uma lei do deserto: o târ dos
árabes. O sangue de um paren-te deve ser vingado mediante a morte do assassino,
ou na falta deste, com a morte de algum de seus familiares” (tradução minha).
5
O CASAMENTO
Uma coisa é a
história, outra é a Teologia. Esta não vive sem a histó-ria e, se levarmos a
reflexão a fun-do, descobriremos que a história sem a Teologia perde o sabor.
Do ponto de vista teológico, o ca-samento (união entre homem e mulher) é um
elemento indispensá-vel ao prosseguimento da raça hu-mana. (VON ALLMEN, 1972,
p. 236). Quando o Antigo Testamento utiliza a expressão “Sedes fecun-dos,
multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a...” (Gn 1.28), está fa-zendo uma
alusão clara ao “casa-mento”.
Neste contexto
não aparece com clareza a menção ao homem e à mulher. O versículo 27, que
perten-ce à narrativa sacerdotal da cria-ção, só fala em ‘adam ( humanida-de).
Entretanto, o que esta em debate é o casamento. E a união do homem e da mulher
que torna possível a procriação, é isso
que se constitui no objetivo primordial deste texto. Numa outra perspectiva, o
escritor javista, ao se referir ao casal hu-mano na narrativa da criação,
per-cebe a profundidade da relação en-tre o homem e a mulher a tal ponto de
considerá-los da mesma nature-za. LEON-DUFOUR (1972, col. 135) ex-plicita ainda
mais esta objetividade teológica do
texto de Gn. ao afirmar que a “sexualidade encontra assim o seu sentido em
traduzir na carne a unidade dos dois seres que Deus chama a ajudar-se
mutuamente no amor recíproco”.
O curioso da
narrativa javista do primeiro par humano é a forma co-mo ele entabula o
desgaste que na-turalmente acontece entre o ho-mem e a mulher que se propõem a
viver uma relação mais profunda. Sem debater aqui as implicações li-terárias e
teológicas, o javista inse-re no texto bíblico o jogo de acusa-ções entre homem
e mulher: “En-tão disse o homem (adam): a mulher (ha’ishah) que me deste por
espo-sa, ela me deu da árvore, e eu co-mi.” (Gn 3.12). Israel vê na fecundidade
um sinal indelével da benção de Yahweh so-bre o homem e a mulher. Neste
contexto de visão, a esterilidade é encarada como ausência dessa
benção e motivo
de outras preocu-pações para a família humana. Ali-ás, a esterilidade de uma
mulher podia se constituir num elemento motivador para a carta de divórcio que
somente podia ser emitida pelo marido. Em casos de infidelidade conjugal, por
parte da mulher, esta era des-pedida em circunstâncias humilhan-tes (Os 2.5-7)
quando não conde-nada à morte (Gn 38.24).
6
ESPOSAS E COMCUBINAS
O Código de Hamurabi, contempo-râneo
da era patriarcal e do qual Is-rael copiou muita coisa, declarava que um homem
podia ter somente uma esposa. No caso desta ser es-téril, podia ter outra. Caso
sua es-posa lhe oferecesse uma escrava para coabitar com ela, então o ma-rido
deveria dispensar esta segunda esposa. Este parece ser o caso de Abraão diante
da esterilidade de Sara (Gn 16.1-2).
Entretanto, como se pode perceber pelo prosseguimento da narrativa
bíblica, este preceito não foi levado muito a sério. O exemplo mais sali-ente é
o de Jacó que casou-se com Lia e Raquel, onde ambas tinham o mesmo status:
esposa (Gn29). Ou-tro caso típico é o de Esaú que pos-suía três esposas ( Gn
26.34; 28.9; 36.1-5). Se caminharmos um pouco mais na historia, verificaremos
que as res trições com relação ao
numero de esposa desaparecem quando Israel entra no período dos Juizes e da
Monarquia.
Nesta época mais tardia encontramos Gideão com muitas esposas (Jz
8.30-31). Já no conjun-to de leis casuísticas em Deutero-nômio, encontramos
normativas a respeito da situação de varias espo-sas para um mesmo homem (Dt
21.15-17). Quando chegamos ao reinado va-mos encontrar verdadeiros haréns ao
redor dos reis: Saul tinha pelo menos uma concubina (2Sm 3.7:12.18); Quando
Davi estava em Hebron, isto é, no inicio de seu rei-nado, já possuía várias
esposas (2Sm 3.2-5) e em Jerusalém con-traiu matrimônio com outras espo-sas e
concubinas (2Sm 5.13); Ro-boão teve
dezoito esposas e cerca de sessenta concubinas (2Cr 11.21); entretanto, nenhum
destes reis fez sombra ao fabuloso harém de Salomão – setecentas esposas e
trezentas concubinas (1Rs 11.3).
A situação da mulher, no período de assentamento em Israel foi
ligeira-mente prejudicada. Ela não gozava de grandes direitos no período
an-terior. Entretanto, com o advento da propriedade da terra, a mulher ficou
relegada a uma função quase que meramente doméstica, um pouco acima da condição
social de um escravo. De qualquer maneira era considerada uma “propriedade” do
homem (THIEL, 1993, p.82). Enquanto o homem tinha privilé-gios, a mulher estava
obrigada a dividir seu espaço com outras mu-lheres, esposas do seu “marido” ou
simplesmente concubinas.
7
FILHOS E FILHAS
O casamento, entre os israelitas, era uma festa marcada por muitos
acontecimentos mas entre estes es-tavam os votos que todos faziam aos noivos,
com a mais pura das in-tenções: “que vivam felizes para sempre e tenham muitos
filhos e fi-lhas”. Ainda hoje, entre os beduínos da Palestina é possível
encontrar nos umbrais das portas dos recém-casados, uma espiga carregada de
grão onde cada um deles represen-ta um(a) filho(a) que o casal deseja ter.
No Israel antigo, ter muitos filhos e filhas significava ser abençoado
ri-camente por Yahweh. Vejamos, por exemplo, a benção que Rebeca re-cebe ao se
despedir de seus fami-liares: “És nossa irmã: sê tu a mãe de milhares de
milhares, e que a tua descendência
possua a porta dos seus inimigos”. (Gn24. 60). Como já afirmamos,
normalmente era a mãe quem dava o nome aos(às) seus(suas) filhos(as). Neste
sentido temos vários textos que e-lucidam esta afirmativa. (Gn 29.31-30.24; 1
Sm 1.20).
É importante ressaltar que o nome definia a essência de cada coisa e
isso se aplica às pessoas – o nome queria dizer o que se esperava, o sentido
que se tinha daquela pes-soa que nascia. Com relação à educação, essa era
tarefa da mãe que ministrava dire-tamente ou encomendava a alguma “pedagoga”
para que educasse a criança nos primeiros tempos.
Depois os meninos se entrosavam na “turma da rua” ou das praças onde passavam boa parte do tempo
brincando/aprendendo (Jr 6.11; 9.20; Zc 8.5). Quando os meninos atingiam a
pu-berdade eram confiados aos pais que tinham a responsabilidade de ministrar o
ensaio sagrado que in-cluía o conhecimento da tradição, das prescrições
rituais, da história do próprio povo de Israel, etc. (Ex. 10.2; 12.26; Dt 4.9).
Fora este en-sino diretamente ligado à questão religiosa (se bem que em Israel
quase tudo era religioso) havia um outro lado da educação que os pais também
ficavam encarregados (Pv 1.8; 6.20).
Evidentemente que isso se refere
ao povo comum. Há uma classe de profissionais que possuía um nível de instrução
bem mais aprimorado. Estes eram os escribas, ou pessoas que lidavam com
administração, os secretários particulares e membros da classe dirigente. Isso
não quer dizer que o conhecimento das Escri-turas estivesse limitado a esses
es-pecialista das letras - um jovem de Sukkot pode dar por escrito a Gide-ão os
nomes de todos os chefes de seu clã (Jz 8.14). Os mestres adotavam um método
tradicional de ensino em que a for-ma oral era comumente pratica. O aluno era
inquirido, recebia explica-ções, repetia as lições, fazia e res-pondia
perguntas (Ex 13.8; Dt 6.7; Sl 78.3-4).
No Israel antigo não se conhece, do ponto de vista de registros,
nenhu-ma escola destinada à educação das crianças. Todos estes ensina-mentos
eram passados pelos pais aos filhos no seio da família, como também fazia parte
das responsabi-lidades dos pais ensinarem uma profissão os filhos. Há um ditado
rabínico que elucida bem esta responsabilidade: “Quem não ensina a seu filho um
oficio útil, o cria para ser ladrão (DE VAUX, 1994, p.87).
Com relação ás meninas, a partir da puberdade, continuavam em com-panhia
das mães e se dedicavam ao aprendizado das lides domésticas.
8 CONCLUSÃO
O que se pode observar nesse contexto social, é que
embora essa civilização assim como outras possam ser muito antigas, se
assemelham em muito ao contexto social dos dias atuais. Sempre será necessária
uma organização política para lidar com as questões sociais, cuidar da
educação, organizar as vidas conjugais e até mesmo se deter em questões como
arte e lazer. Porque como já foi comentado, mudam-se os tempos e as
civilizações, mas o ser humano continua o mesmo, necessitando sempre de uma
vida comum de compartilhamento em sociedade.
5
REFERÊNCIAS
ELWELL, Walter. Manual
bíblico do Estudante. Rio de Janeiro: CPAD, 1997.
FILLION, Louis-Claudio. Enciclopédia popular de cultura bíblica. Rio de Janeiro: Central
Gospel, 2003.
TENNEY, Merril C et al. Vida
cotidiana dos tempos bíblicos. 3 ed. Miami, Flórida: Vida, 1988.
Por: Joelsam
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